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terça-feira, 18 de junho de 2013

Nada, de novo? (por Michel Yakini)



A Copa, já diz no nome, é pra quem tem copa. Os estádios brasileiros são elitistas desde sempre, tanto que antes, desde o inicio do século XX, tinha um estilo comparado aos atuais desfiles de chapéus-botox nos turfes no Jóquei, foi só o fim da Geral que deixou tudo como antes e tirou uma parte, que eles chamam de “penetras”, da festa. Essa é uma pauta perdida.

Agora nas ruas o caldo tá engrossando, só me surpreende as surpresas: 

A ditadura havia acabado só pra vocês! A polícia é violenta todo dia! A gente tem medo dela, sim. Porque quando querem nos calar, não vem com bala de borracha, é chumbo no lombo, mané. Porque sabem que a gente não tem advogado solidário pra nos defender. Porque sabem que não vai ter celebridade se maquiando com nosso sangue. Pois a gente é a parte que pode sumir.

Como diz um amigo meu: "Jacaré que vacila, vira bolsa de madame". Tô ligeiro, e não me inflamo de emoção, mesmo quando isso me ameaça, pois cinco minutos ouvindo com alegria o coro do “povo” me fez vacilar e ficar de costas pra um grupo de “Carecas Nacionalistas” exigindo seu bolo na democracia, com faixas bem legíveis pedindo “Intervenção Militar, Já!”. Tô ligeiro! Sei bem de quem eles querem o fim e quem eles seduzem pra parceragem. Falta pouco pro Datena, o Willian Bonner e Fátima Bernardes, mais o Boris Casoy colar. O Jabor já pediu desculpas, tá juntão!

Na boa, não caio nessa de levantar slogan: “Verás que um filho teu não foge a luta” e ficar cantando o hino nacional, carregando bandeira de “ordem e progresso”, e dizendo “eu amo minha pátria”. Sou filho da dona Maria Elisa, a merendeira da escola, e foi pra ela que eu expliquei o motivo de estar lá, só pra ela. Depois que a onda passar o foco vem pra gente e é possível que todo ódio acumulado dos coturnos seja descontado nas quebradas mais uma vez. Ou onde vocês acham que eles fazem seus treinamentos e descarregam a fúria contida, pra te proteger?

Pátria? Parece papo de TFP. Tô aqui de imposição, desde os navios, depois nos paus-de-arara e agora pela migalha oferecida pra servir.  A minha mãe é mãe solteira!

Ainda sim, o melhor lugar agora é as ruas!

Ficar na quebrada, mais do que nunca, não vira! Só chega noticia de telejornal bomba e indignação de quem não consegue terminar seu turno até as seis ou chegar a tempo de ver a novela das nove. Então é melhor colar, somar no que nos interessa, mas sem empolgação, saber onde anda. Até porque tem muitos dos nossos lá, na linha de frente.

Mas ficar andando na Vila Olímpia, na Berrini, dá a seguinte sensação: De que a qualquer momento o “povo” vai atravessar a rua, virar uma esquina, e entrar pra dentro dos prédios chiquetosos, no seu “lar doce lar”, e a gente vai ficar mais uma vez esperando o trem sujo da Leopoldina.

Mas já que você acordou de seu sono tranquilo, ganhou o beijo de cinderela, e agora acha legal ser auto intitular “povo”, saiba que pra mim é nada, de novo, cara pálida!

Caminhada atentada, sem tempo pra lagrimar!


Porque se o “povo” conseguir o que quer é certo que eles voltem pros cursos endinheirados das faculdades públicas, pras escritórios engravatados, pros condomínios de luxo, pros pedidos de paz branca na Paulista, pra cara pintada de tucano e pro jantar que está servido. Espero estar enganado,  mas tá com cara, mano véio, que pra gente não dê em nada, de novo!

2 comentários:

Juliano Salustiano disse...

Respeito, mas discordo. Tinha gente de todo lugar, de todas as classes participando, por isso foi importante. O movimento é romper com a apatia. Vejo que rico e pobre já se acostumaram a rir e a chorar, respectivamente, e toda a raiva que supostamente surge é efêmera, pois sempre nos faltou união. Agora é hora de tentar desfazer esse ciclo de repetição.

Quanto a ir pra lugares ricos, eu concordo que é triste, pois é o único lugar que a mídia e o sistema enxergam.

cidinha da silva disse...

Falou e disse,Michel! Você é negro, conheço e reconheço sua voz, mas sinto falta de uma demarcação maior da dimensão racial neste texto enérgico e contundente. Minha crítica ecoa em ti ou não? O abraço fraterno e carinhoso de sempre, Mano (e você sabe que não te chamo assim por modinha, mano pra mim, é mesmo quem é irmão).