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terça-feira, 22 de maio de 2007

PIRITUBA PERIFERIA por Mannu UF

Mannu UF - Mc e compositor do grupo Alerta ao Sistema.

Pirituba periferia, cresci e ainda moro aqui e ai já se vai mais de 20 anos. Lembro da antiga, lá por volta de 1990, eu tinha sete anos de idade, quase todas vilas, ou melhor favelas, ainda continuam com os mesmos nomes. Buraco do Sapo, Santa Terezinha, favela do Monte Alegre, Saloá, Morro do Rato e favela do Nardini. Continuam com os mesmos nomes porque, com muita sorte, a tropa do governo não desabrigou ninguém dessas quebra, mas algumas favelas daqui não tiveram a mesma sorte, como as favelas da Nassau e do Anastácio, que hoje não existem mais.
Naquela época, tinha muito barraco, ruas de barro, mato e esgotos improvisados. Como é de praxe brasileiro ser jogados em favelas, puraqui também não foi diferente, pois muitos pais de famílias se alojaram nessa região pobre, uma grande maioria vindos de outros estados. Eles acreditavam que aqui em São Paulo melhorariam a vida e teriam oportunidade de empregos. Hoje, em 2007, mudou a madeira pelos tijolos vermelhos, mas ainda em alguns pontos tem favelas que não tiveram uma certa evolução e continuam com barracos de madeira, inclusive em áreas de risco, quase duas décadas depois o descaso continua, vai vendo.
Pra quem nasce em favelas, o peso do problema é outro, tá ligado. Por ser tão embaçado viver em situação desfavorável, muitos buscam a criminalidade, pra tentar dar uma volta por cima e ter o que nunca se pode ter. É aquela fita, se ele pode ter porque eu não?
Muitos irmãozinhos, logo cedo, vão crescendo com esse tipo de pensamento. Hoje em dia, muitos influenciados pelos meios de comunição e esquecidos na miséria, comendo o pão que o diabo amassou, se tornam um alvo fácil do sistema.
Eu mesmo vi muitos que poderiam ter um futuro brilhante, infelizmente não tiveram, escolheram o crime, mas acredito que as pessoas que nascem no gueto, não entram assim por conta própria, não entram no crime só por entrar, tem muitas coisas que fazem os chegados fazerem esse tipo de escolha. Tudo começa quando criança, o ensino que não chega, o desemprego que leva a maioria dos pais a matar sua revolta na bebida alcoólica, uma coisa vai girando milhares de outras coisas. Assim, muitos daqui vão crescendo sem estrutura. Quando vão ver já tão envolvido até o pescoço, tem que prestar conta pra justiça, passar por torturas no distrito e ficar preso numa cadeia super lotada, sendo tratado feito bicho. Na verdade isso já é um processo seletivo, criar pra depois de grande exterminar.
Com muita sorte, o hip-hop chegou até mim antes que acontecesse algo pior, mas só o fato de ver uma grande maioria de pessoas que crescem nos guetos, sendo mortas pelo governo, me deixa bastante triste. Perdemos muitos irmãos diariamente e nada é feito contra isso. Sempre quando políticos aparecem puraqui, vem com os mesmos discursos ensaiados e bonitos. São muitas promessas de melhorias, capazes de induzir o povo a votarem neles e o povo periférico vota mesmo, não porque são “burros”, como muitos dizem, mas porque o povo sonha, tem esperança que um dia esse país vai vingar e vai ter alguém honesto no poder, mas por outro lado, muitos já estão acordando, já não tão abraçando idéia de engravatado e isso prova que tem acontecido uma certa evolução quando se fala de política na periferia. Uma grande parcela de culpa, no meu entender, dos problemas periféricos são dos políticos, cada promessa não cumprida mata centenas de pessoas por dia. Políticos corruptos que nunca vão pra atrás das grandes, na lei sempre tem uma brecha pra livrar o deles e cada vez mais me convenço, que lei brasileira foi feita só pra pobres, porque ela só funciona com a gente.
O que acontece desse “lado escuro”, como dizem os burgueses, é problema nosso e isso fica mais evidente quando eles tentam ajudar alguém daqui.
Por quê?
Quando programas do estilo Gugu e Faustão, fazem matérias em favelas, o que eles estão buscando afinal?
Será que estão interessados em ajudar, ou em comover o publico que assistem seus programas, para dar audiência?
Quem está interessado em “ajudar”, não beneficia uma única família. Se o propósito do programa fosse ajudar, ajudaria em massa, porque resolvendo o problema de um, não resolve o problema de um todo.
O hip-hop e os escritores periféricos, também são uma saída contra o sistema. Achamos nossa forma de protestar, reivindicar e mostrar a verdadeira realidade, que é distorcida pelas emissoras. Hoje conseguimos resgatar a auto-estima e mostramos quem é o verdadeiro inimigo, seja numa letra de rap, num escrito, ou em outro tipo de luta social que visa melhorias para periferia. Temos nossa própria cultura, nossa forma de pensar e se, de repente, os poderosos do Brasil, acharam que iriam passar por cima de nóis assim tão fácil e não iria ter revide desse lado, é porque eles não conhecem a história do país onde moram.
Os descendentes de Zumbi tão em cena.


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