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terça-feira, 14 de agosto de 2007

MENINO (parte I e II) por Raquel Almeida

MENINO
Menino cresceu junto com suas quatro irmãs e com sua mãe, que é um exemplo de mulher. Admiro ela pela força de trabalhar longos anos pra sustentar seus filhos sozinha.
O Menino sempre foi saudável, forte e bonito. Ele vivia com os muleques na rua. Brincava de empinar pipa, bolinha de gude, carrinho de rolimã... Nossa muitas brincadeiras!

Os anos foram passando e o Menino crescendo, não sei o motivo, mas acredito que por embalo, ele começou a usar drogas, maconha e cocaína. Só que não ficou por ai, o Menino começou a se envolver com a mulecada que diziam ser “Função” lá na vila. Agora ele não só usava drogas como também passava, roubava...

Enfim, o Menino foi pego. Ele ficou preso um tempo, menos de um ano, por ser réu primário. O Menino saiu da cadeia decidido a não se envolver mais com o crime.

Não demorou muito o Menino começou a se envolver novamente. Dessa vez não só por modinha, muitas outras coisas giravam em torno, como por exemplo, a falta de credibilidade das pessoas com ele. Menino chegou até a freqüentar a igreja por um tempo. Foi para uma clínica de dependentes químicos, mas nada resolveu, o Menino voltou novamente para o crime. Em menos de dois anos ele foi preso novamente. Dessa vez sua casa caiu!

Invadiram seu barraco, acharam sua arma e drogas em sua casa. O Menino foi pego junto com um colega. Mais tarde o Menino disse que havia sido forjado pelos policias, com drogas. Dessa vez pegou seis anos de cadeia. Sua mãe, pela grande decepção, ficou um bom tempo sem ir vê-lo. Ela dizia que era pra ele aprender, pois não havia criado um filho bandido.

Mas como o coração de mãe fala mais alto, ela começou a visitá-lo e começou a fazer correria com vários advogados para soltar o Menino. Ele começou a ter “saidinha” nos feriados. Uma vitória! Logo após ele conseguiu um emprego e passou a freqüentar a vila diariamente. Em uma das visitas, o Menino se atrasou e pediu para um primo seu levá-lo de moto até a casa de sua mãe pra pegar um dinheiro e ir embora.

Por um vacilo de seu primo, que estava sem capacete e fazendo graça com a moto, eles chamaram atenção de uns gambéns que estavam fazendo ronda pela vila. Os dois perceberam a aproximação da policia, só que era tarde demais, o Menino levou um enquadro em condicional.

Como já era de se esperar, os policias revistaram eles e descobriram que o Menino estava um pouco atrasado pra voltar. Os policiais começaram a pesar na deles e disseram que queriam uma arma e dois mil reais. O Menino explicou que saiu do crime, que tava dando um trampo, mas os gambés não sossegaram e deram um prazo. O primo do Menino ficou desesperado, ele nunca tinha se envolvido com criminalidade. Os policias anotaram a placa da sua moto e o endereço dele.

Após esse episódio, o Menino saiu da “Penita” e jurou que não se envolveria mais com o crime. Só que tinha aquela parada a ser acertada com os policias, que falaram que se trombasse ele o forjaria ou o apagaria. Mesmo assim, ele continuou levando a vida de boa, saia, ia curtir, conseguiu um trampo novo, não era registrado, mas não dava pra esperar muito por ele ter antecedentes criminais. Ele trampava como ajudante para um caminhoneiro, que o conhecia desde muleque.

Quando o Menino recebeu o salário, foi comprar um panos com a namorada. Quando estava voltando pra casa quem que ele tromba? Os policias, que disseram pra ele que só não iam apagá-lo porque o lugar tinha muita gente. O Menino gelou, mas trocou uma idéia de boa com os caras. Disse que tava trampando, que não queria mais saber de crime, que tinha parado com tudo.

Usando de uma falsa dó, mandaram o Menino embora dizendo que o primo dele tava na mira e pro Menino ficar esperto.

Depois de quatro anos na prisão o Menino pensava em sair, viver em paz com sua família, aproveitar a vida, dessa vez de verdade. Arrumar um trampo e ficar de boa. Só que com essa ameaça dos policias, ele ficou revoltado. Já não devia mais nada para justiça e se pá ia se ferrar por causa de policiais safados.

Hoje, o Menino trabalha, fica de boa, mas sempre atento quando sai na rua, pois se trombar os policias pode ser fatal.

Estou orgulhosa do Menino ter saído do crime. Não só eu, como toda sua família. Peço a Deus que dê forças ao Menino para que ele continue assim.

O que fazer com os policias?

Só Deus sabe. Quem é periférico tem que abaixar a cabeça para os gambéns. Eles são a autoridade, não podemos denunciar quando eles matam um menino da favela. Não podemos denunciar quando muitos de nossos meninos são forjados. Não podemos denunciar quando eles espancam um pai de família.

Somos obrigados a engolir mais esse sapo do governo, que manda a policia para as ruas pra fazer esse tipo de coisa com nossos Meninos da periferia. ____________________________________________________________________________________
MENINO (PARTE II)

Já não era sem tempo, novamente o Menino se envolve com drogas. Abandonou o trampo que havia conseguido com um conhecido, como diz o ditado popular, chutou o balde.

Agora ele anda bem loco pela madrugada, tá envolvidão com o crime, não sei o porquê ele se envolveu com tudo isso. Parecia que dessa vez estava decidido a não se envolver mais, só que num piscar de olhos lá estava ele aprontando novamente. Perdendo a confiança de todos e principalmente de sua mãe. Ele se afunda no mundo da vida fácil, não tem desculpa dessa vez, trampo ele tinha, familiares e amigos depositaram confiança total nele, só que parece que tudo isso não foi suficiente, parece que o esforço de sua mãe não foi o bastante.

O sonho da sua mãe sempre foi ver um de seus filhos formado, sendo um homem, uma mulher de bem, com uma profissão digna, pois a profissão dela ela julgava indigna pelas humilhações que ela passava como diarista.

Mais uma vez a mãe do Menino está doente, desgostosa da vida, pensa todo o dia no que ela errou na educação do Menino, sendo que ela sempre trabalhou pra não faltar nada dentro de casa, ela ora todo dia dizendo a Deus que prefere vê-lo morto do que nas drogas de novo.

O Menino, nem liga para o estado que sua mãe se encontra. Pra ele, ela nem sabe como ele está vivendo e se sabe: dane-se, não faz muita diferença. Ele é o foda da quebrada agora. Droga, moto, mulheres. O que ele vai querer mais? Menino não se lembra mais do dia que sua mãe foi na Penita visitá-lo e justamente nesse dia tava rolando uma rebelião. Sua mãe só chorava pensando que havia acontecido alguma coisa com ele, lá fora vendo toda aquela cena, orava e pedia a Deus proteção ao Menino.

Mal sabe ele que sua mãe está doente e abatida, que ela só chora quando está sozinha, lembrando do Menino quando era criança, dizendo que quando ele crescesse ia cuidar dela.

Lembranças... somente isso que fica na mente da mãe. O Menino, o que se passa em sua mente não se sabe. Sabemos que ele acha que a vida é pra sempre e que se ele for pra outro lado da muralha vai ter novamente o apoio e a dedicação da sua mãe.

Esses dias a mãe do Menino teve um sonho bonito, sonhou que estava em um lugar diferente, perto de Deus. Ela ficou feliz por não sofrer mais, de estar na verdadeira paz, a qual ela acredita que é no céu. Chamou suas quatro filhas e disse que iria partir, ia olhar por eles do céu agora, que o Menino tinha que aprender a viver sozinho, que muitas pessoas só aprendem quando perdem a mãe. Suas filhas estão abaladas com essa notícia que sua mãe contou, mas o Menino nem sabe que mais cedo ou mais tarde vai ficar sem o seu verdadeiro apoio.

Ele agora só “curtir” a sua desgraça, enquanto sua mãe curte o sofrimento de ter um filho perdido no mundo da criminalidade.

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