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terça-feira, 10 de setembro de 2013

Nóis em movimento. (por Michel Yakini)




 Nos últimos dois anos fiquei com uma dúvida zanzando na mente, entre a miragem ou tato real de um movimento de literatura nas beiras de SP.

Digo dois anos, porque desde 2003 quando comecei a viver a parada, como leitor e anos depois como parte da engrenagem, não duvidava, e na fervura de tantos saraus, coletivos, autores, estudos, revides e livros, acreditar em uma cena espontânea é pouco.

O fato é que antes da lagoa expandir as troc...as e as proximidades eram mais simples e recorrentes. Já na maré cheia, o tamanho e a beleza são de chorar, mas surgem às ilhas e vilarejos isolados, o que não significa atraso ou adianto, e sim a alteração dos territórios, o redesenho dos terreiros.

O que é manjado se confirma: o ésse ficou maiúsculo e sibilante e as periferiaSSSS estão revelando cores, que renovam mas nem sempre combinam. Quem tá no sereno sabe o quanto a contradição caminha junto e, às vezes, bebe no mesmo copo.

Contradição aqui como qualidade, do que provoca o encontro da frente com o verso, no sentido de abrir caminhos, de comunicar, de se perguntar e ser perguntado, de “cruzar por amor sem pudor”, no “nó do ebó da encruzilhada”. No enigma do poeta em dizer que “nóis pra nós é singular”, aí tá nosso jeito, nossa ginga de movimento.

Essa coisa de “mapinha pra não se perder no caminho”, “receita do mestre-cuca” e “idolatria de monumento”, tá na cara que nóis num gosta. A gente lê ao contrário, invertido, falavreando. Nosso mar é roda, tem negrume, onde se fala portunhol com guaraní-matuto.

A gente dança com a letra, pinta com a voz e escreve com a imagem, veste escudo e aponta a lança, às vezes beque, às vezes ponta.

Mas também toma rasteira, desafina, esbraveja distoado e cega no holofote, desarmoniza. Uns na onda, outros contra maré, uns curtindo a brisa, outros na fadiga, uns no foguetório e outros se apagando. Mas se olhando, nem sempre se reconhecendo, mas se olhando, atento no movimento.

Agora, tem pergunta que amarra na boca. No que vai dar? Onde vai chegar? Amarra, pode crê que amarra. É colher fruta sem madurar.

Deixa a menina corrê, caí-levantá, esfolá u joelho i tirá a casquinha pra vê calejá.

Deixa u menino andá descalço, queimá u pé nu asfalto, aprendê a desbicá. Deixa ser ancião, pra caminhá lento, pará uns momento, pra podê descansá.

Senão a magia esfarela i u doce azeda. Comê bolo quenti dá dor de barriga, lembra? Enquanto isso a gente faz u café, arruma a mesa, us copo de massa de tomate, u pão co margarina, pros nosso e pras visita.

Movimento é mudança, que não se evita, é sopro incessante, é memória, anunciação parida.

É o agora, por causa do antes, temperando o depois. Espiral. São os nós firmado em nóis que não desata.

É real e disso não tenho mais dúvida.
 

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